Fósseis de 1,8 milhão de
anos encontrados na Geórgia sugerem que a aparência dos ancestrais
humanos era muito variada; e que os 'Homo habilis', 'Homo rudolfensis' e
'Homo erectus' poderiam ser uma mesma espécie
Segundo os pesquisadores, o Crânio 5 pertenceu a um indivíduo da espécie Homo erectus.
Ele, no entanto, era diferente de outros fósseis encontrados
anteriormente, o que sugere que a espécie era mais variada do que se
pensava
(Museu Nacional da Geórgia).
Um crânio descoberto em 2005 na região de Dmanisi, na Geórgia, pode
obrigar os cientistas a reescreverem toda a história de evolução da
espécie humana. O fóssil possui aproximadamente 1,8 milhão de anos e é o
mais antigo crânio completo já encontrado por pesquisadores.
Suas
características físicas — a caixa craniana pequena e o grande maxilar —
nunca haviam sido encontradas em conjunto antes, desafiando as divisões
traçadas pelos cientistas para separar as espécies de ancestrais
humanos. Segundo um estudo publicado nesta quinta-feira na revista
Science, a descoberta sugere que os primeiros membros do gênero
Homo, aqueles classificados como
Homo habilis,
Homo rudolfensis e
Homo erectus, faziam parte, na verdade, da mesma espécie — seus esqueletos simplesmente pertenceriam a indivíduos de aparência diferente.
CONHEÇA A PESQUISA
Título original: A Complete Skull from Dmanisi, Georgia, and the Evolutionary Biology of Early Homo
Onde foi divulgada: periódico
Science
Quem fez: Christoph P. E. Zollikofer, entre outros pesquisadores
Instituição: Museu Nacional da Geórgia, entre outras
Dados de amostragem: Análises de cinco crânios encontrados na região de Dmanisi, na Geórgia
Resultado:
Os pesquisadores concluíram que, apesar das diferenças entre si, os
crânios pertenceram à mesma espécie de ancestral humano, que viveu na
região há 1,8 milhão de anos
Essas espécies foram todas encontradas na África, em períodos que vão
até 2,4 milhões de anos atrás.
Os pesquisadores usaram a variação no
formato de seus crânios para classificá-las como espécies diferentes,
porém aparentadas. No entanto, desde a descoberta dos primeiros fósseis,
os cientistas têm enfrentado dificuldades para traçar uma linha
evolutiva entre elas, sem conseguir apontar de maneira definitiva qual
deu origem às outras e aos
Homo sapiens.
O novo crânio descoberto na Geórgia — que ganhou o nome de Crânio 5 —
combina entre suas características uma caixa craniana pequena, um rosto
excepcionalmente comprido e dentes grandes. Até agora, o sítio
arqueológico só foi parcialmente escavado, mas se revelou um dos mais
importantes já descobertos. O fóssil foi encontrado ao lado dos restos
mortais de outros quatro ancestrais humanos primitivos, um grande número
de ossos de animais e algumas ferramentas de pedra.
Segundo os cientistas, os fósseis estão associados ao mesmo local e
período histórico, sugerindo que as ossadas pertenceram todas à mesma
espécie de ancestral humano. Isso forneceu aos pesquisadores uma
oportunidade única para comparar os traços físicos de indivíduos de uma
mesma espécie e o que descobriram foi uma grande variedade de tamanhos e
formas, mas nada diferente da variação encontrada entre os humanos
modernos. "Graças à amostra relativamente grande de Dmanisi, pudemos ver
a grande diferença que existia entre os indivíduos. Essa variação,
porém, não é superior à encontrada entre populações modernas de nossa
própria espécie, dos chimpanzés ou bonobos", diz Christoph Zollikofer,
pesquisador do Instituto e Museu de Antropologia, na Suíça, e um dos
autores do estudo.
A partir dessa conclusão, os cientistas sugerem que os fósseis mais antigos do gênero
Homo, com origem na África, também representavam a variação entre os membros de uma única linhagem evolutiva: o
Homo erectus.
"Uma vez que vemos um padrão semelhante de variação no registro fóssil
africano, é sensato assumir que também houve uma única espécie
Homo naquela
época", concluiu. "E, uma vez que os hominídeos de Dmanisi são tão
parecidos com os africanos, assumimos que todos representam a mesma
espécie."
Duas espécies em um mesmo crânio – O Crânio 5 foi
escavado em duas etapas pelos pesquisadores. Primeiro, eles descobriram a
pequena caixa craniana, no ano 2000. Seu tamanho diminuto — ela media
apenas 546 centímetros cúbicos, em comparação aos 1350 centímetros
cúbicos dos humanos modernos — sugeria a existência de um cérebro
pequeno. Durante os anos seguintes, continuaram escavando a região, em
busca do maxilar que iria completar a figura.
Em 2005, finalmente encontraram os ossos que faltavam, mas, ao
contrário do esperado, o maxilar era enorme, com dentes grandes. “Se a
caixa craniana e o resto do Crânio 5 fossem encontrados como fósseis
separados, em lugares diferentes da África, eles seriam atribuídos a
espécies diferentes", diz Christoph Zollikofer.
Durante os oito anos seguintes, os pesquisadores realizaram estudos
comparativos dos cinco crânios encontrados no local. Como resultado,
concluíram que eles pertenceram à mesma espécie de ancestrais humanos,
surgidos pouco tempo depois de o gênero
Homo divergir do
Australopithecus
e se dispersar da África. "Os fósseis de Dmanisi parecem muito
diferentes uns dos outros, e seria tentador classificá-los como espécies
diferentes", diz Zollikofer. "No entanto, sabemos que esses indivíduos
vieram do mesmo local e tempo geológico, então eles devem, em princípio,
representar uma única população de uma única espécie.” Segundo os
cientistas, diferenças de idade e sexo devem ser responsáveis pelas
principais diferenças morfológicas.
Modelos
dos cinco crânios encontrados na Geórgia. Eles estão colocados em
ordem, do 1 ao 5, demonstrando a diferença que existia entre os
indivíduos
Assim, os pesquisadores sugerem que a ideia da existência de várias espécies
Homo —
cada uma especializada para um ambiente do Terra — seja derrubada. Ao
contrário, eles defendem a existência de uma única espécie
Homo erectus,
surgida no continente africano, capaz de se adaptar aos diferentes
ecossistemas e que viria dar origem aos seres humanos modernos. A
hipótese não deve ser aceita de imediato pela comunidade científica, mas
dar origem a discussões acadêmicas e mais estudos que podem, eles sim,
mudar o modo com a história evolutiva da espécie humana é narrada.
fonte: veja